Richarlison, Antony e Raphinha são alguns dos jogadores
da seleção brasileira que estiveram na disputa da Copa do Mundo após movimentarem
dezenas de milhões de euros em times europeus – fato já corriqueiro para um
país cujos atletas encantam os maiores clubes do “Velho Continente”. Para
compreender melhor essa dinâmica, um estudo recente desenvolvido por
pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) traz novas
perspectivas sobre as transferências de jogadores no Brasil e ajuda a entender
como o mercado nacional se tornou um exportador de talentos.
A pesquisa revela que os clubes brasileiros valorizam
jogadores mais velhos e experientes em relação àqueles que estão despontando.
Conforme essa valorização aumenta para os maiores jogadores, acaba
ultrapassando a capacidade do mercado nacional, já que se tornam montantes
comportados apenas pelo mercado europeu, transformando o Brasil num exportador
de talentos.
Para chegar a essa análise, o estudo mapeou
transferências entre os principais clubes brasileiros num período de dois anos
(2018 a 2020). O objetivo foi mensurar fatores que afetam a probabilidade de um
jogador ser transferido e, também, o valor das movimentações, além de verificar
até onde as expectativas de performance dos atletas refletem nos valores das
transferências – este, aliás, foi o primeiro levantamento a incluir tal fator
na análise das negociações de transferências de jogadores de futebol no
Brasil.
“Incluímos um índice inovador para capturar a capacidade
dos jogadores de atuar de acordo com as expectativas dos especialistas”, pontua
o estudante Rafael Kujo Monteiro, autor da pesquisa.
Até então, os estudos na área se concentravam mais no
mercado europeu. Monteiro destaca que trazer a pesquisa para o contexto
brasileiro é importante porque joga o foco para um país que tem tradição
futebolística. Ele explica ainda que o levantamento foi feito em duas etapas,
com metodologia que ajudou a lançar luz sobre como cada aspecto influencia as
movimentações.
“Primeiro, calculamos a probabilidade de um jogador ser
transferido de clube. Depois, estudamos os fatores que afetam o preço de um
atleta que foi transferido”, afirma.
A escolha por essa metodologia busca retirar possíveis
vieses. Sem a divisão em duas etapas, o fato de um jogador estar emprestado
para outro clube, por exemplo, não afetaria o valor de uma transferência. Cerca
de 9% de todos os jogadores do estudo estavam emprestados entre clubes da Série
A do Campeonato Brasileiro, mas quando são observados somente os que se
transferiram, a parcela sobe para 22%. Fica evidente, portanto, que o fato de
ser emprestado para outro clube de Série A afeta não somente o valor da
transferência, mas a chance do jogador se transferir.
“Após esse processo, a pesquisa mostrou que, no mercado
brasileiro, as expectativas de performance têm um papel importante ao definir
qual jogador é transferido e o valor da transação”, explica.
Atletas que superaram as expectativas de especialistas
com relação à sua performance no ano, independentemente do nível de performance
específico, tiveram mais chances de transferência e foram capazes de atrair
valores maiores. Um jogador do qual se esperava um nível de performance baixo,
mas que apresentou nível mediano, teve mais chances de se transferir do que
outro jogador que também registrou nível mediano já esperado antes mesmo do
campeonato iniciar. No caso de ambos se transferirem, o primeiro seria capaz de
atrair valores maiores.
Uma implicação dessa constatação é o fato de que
jogadores dos quais se espera nível altíssimo de desempenho – serem os melhores
do campeonato – não conseguem superar expectativas. Assim, dificilmente
apresentam maiores chances de transferências. Como as transferências estudadas
eram somente entre clubes brasileiros, isso pode significar que caso os
jogadores tops do Brasil se transfiram, é provável que eles sejam enviados para
um clube do exterior.
Influências – O estudo mostrou ainda outros fatores
que influenciam as transações: tempo restante do contrato, histórico recente de
transferências do jogador e atuação do clube vendedor, além de características
específicas do atleta, como idade e nacionalidade.
“Essas variáveis, contudo, já foram estudadas em mercados
europeus e também são significativas nas movimentações brasileiras”, ressalta
Monteiro, acrescentando que as descobertas mostram que o mercado brasileiro
funciona de forma semelhante ao europeu, o que ajuda a ter uma visão global do
funcionamento das movimentações e trazer novas perspectivas para a tomada de
decisão.
Para gestores e agentes que participam do mercado, o
levantamento é um ponto de partida relevante para decidir quem será transferido
e por qual valor, pois ao mostrar que existem possíveis vieses na tomada de
decisão, pode ser uma ferramenta para movimentações mais
assertivas.
Segundo o estudante, os gestores de clubes podem
considerar as expectativas antes de comprar um jogador. Caso se perceba que o
esportista está sobrevalorizado porque superou expectativas iniciais, talvez
seja melhor buscar jogadores de mesmo nível, mas que cumpriram as expectativas,
para tentar “pagar menos” e obter o mesmo resultado. Da mesma forma, se o
jogador superou o esperado, talvez o ideal seja esperar mais um tempo para
perceber se realmente se trata de uma expectativa inicial errada ou se o atleta
retornará ao esperado dentro de um curto/médio prazo, o que encareceria ainda
mais a compra do jogador.
“Quando é sabido que as expectativas passadas influenciam
as transferências, os gestores e diretores podem tentar mitigar isso
considerando apenas a performance real do jogador”, aponta o especialista. “O
preço, então, refletiria melhor a contribuição do jogador para o time”, conclui
o autor da pesquisa.
Além de Rafael Kujo Monteiro, estudante e autor do
estudo, assinam o trabalho Rodolfo Prates e Leonardo Frota, professores da
Escola de Negócios da PUCPR.
Publicado às 10h49
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